Post: Gays e o ódio pelas divas pop

O ódio dos fãs de diva pop contra outras divas pop.

Em algum lugar entre a catarse e a obsessão, há um fenômeno curioso e quase universal: o fascínio dos homens gays por divas pop. Beyoncé, Madonna, Lady Gaga, Britney Spears, Mariah Carey, Cher — essas figuras orbitam a psique de muitos como arquétipos de poder, resiliência e reinvenção. Mas há algo mais profundo acontecendo aqui, algo que extrapola a admiração e se infiltra nas entranhas da identidade e do pertencimento. O que começa como um refúgio emocional pode se transmutar em idolatria cega, e quando a linha entre o afeto e a alienação se dissolve, surge um território nebuloso, onde o amor pela arte pode se tornar um cárcere psicológico.

A psicanálise nos ensina que a identificação é um dos mecanismos mais primitivos do psiquismo humano. Para um jovem gay, crescendo em um mundo que ainda o rejeita em diferentes níveis, a imagem da diva é mais do que um espetáculo: é um espelho de resistência. As divas pop frequentemente carregam narrativas de superação, opressão e renascimento — elementos que ressoam profundamente em quem aprendeu cedo a existir nas margens. No palco, essas mulheres se tornam quase mitológicas, encarnando uma força que parece inatingível, mas absurdamente necessária. E assim, um vínculo se forma, um pacto silencioso entre artista e fã, onde a dor do indivíduo se dissolve na grandiosidade do ícone.

A Teoria Cognitivo-Comportamental (TCC) nos ajuda a compreender como esse comportamento pode se transformar em um ciclo disfuncional. O pensamento dicotômico — a crença de que a diva é perfeita e qualquer crítica a ela é inadmissível — reforça padrões de cognição rígidos. O reforço positivo também desempenha um papel crucial: o envolvimento na comunidade de fãs traz pertencimento, aprovação e uma sensação de identidade compartilhada, o que pode criar um sistema de recompensa viciante. Quando esse vínculo se torna excessivo, pode resultar em evitação experiencial, onde o indivíduo foge de suas próprias questões emocionais mergulhando obsessivamente na vida da artista.

O problema surge quando essa projeção se torna uma válvula de escape excessiva. Quando o culto à diva deixa de ser um canal de empoderamento e passa a ser um mecanismo de alienação, algo se perde. A energia que poderia ser investida em autoconhecimento, crescimento e interações autênticas é sugada por um loop de exaltação e defesa incondicional. O indivíduo se dilui na devoção. A idolatria assume contornos de um transtorno, onde qualquer crítica à artista favorita é tomada como ofensa pessoal, e os espaços de debate se tornam trincheiras de guerra virtual. O eu se esvai na identidade coletiva do fandom, e a singularidade se esconde sob um manto de lealdade feroz.

Mais do que isso, o apego excessivo à figura da diva pode cristalizar um padrão de dependência emocional. A fantasia de resgate, a busca por uma mãe simbólica, a necessidade de validação externa — tudo isso se condensa na relação com a artista. Quando um homem gay projeta sua força, sua dignidade e seu senso de valor unicamente em uma figura externa, ele se priva da chance de construir essas qualidades dentro de si. O empoderamento se torna terceirizado, e o crescimento pessoal se paralisa.

Claro, há beleza no rito, na paixão, na catarse coletiva de um show onde milhares gritam em uníssono, onde um verso cantado ao vivo parece dissolver anos de dor e silenciamento. Mas o que acontece depois que as luzes do palco se apagam? Quem somos nós quando a música para?

A chave não está em renunciar às divas, mas em ressignificar essa relação. Admirar, celebrar, vibrar — sim. Mas sem perder de vista a si mesmo. Sem permitir que a paixão pelo ícone substitua a jornada do próprio eu. Porque, no fim das contas, nenhuma diva pode nos salvar de nós mesmos.

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